terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Grande passeio à Outra Banda (4 de 10)

Ora chegados á quinta, 
O prazer geral requinta.

Uma barraca de comes e bebes, J. Novaes Jr., c 1900.
Imagem: Internet Archive

Debaixo de alto pinheiro, 
Todo o rancho prazenteiro, 
Se sentou: e a condessa 
Logo aberta foi depressa.

Grupos de arraial, J. Novaes Jr., c 1900.
Imagem: Internet Archive

Tiraram pois as colheres, 
Garfos, facas e palitos,
Riam-se immenso as mulheres...
Grande chuva de bons ditos, 
Com retumbantes risadas... 
As tres gallinhas assadas... 
Alli logo devoradas... 
Muita pilhéria e laracha... 
Para lavar o estomago, 
O nosso padre Luiz, 
Todo galhofa... n'um triz...
Lá se atirou á borracha. 

O dia da espiga, J. Novaes Jr., c 1900.
Imagem: Internet Archive

(Grita Gambôa) 
"Isto é melhor do que em casa! 
Viva a geral alegria!... 
As alegrias eternas!"
E cada filha pedia... 
Que lhe dessem uma ása, 
Comendo o Alfredo as pernas.

Dona Francisca, o pescoço... 
Outros o peito... um destroço! 
E tudo ria animado... 
E o Canastro era offertado, 
Ao burriqueiro, e ao moço.

Ora a mana que já estava, 
Com o Feio, de derriço, 
Sem saber que era casado, 
Toda delambida e bella, 
Dá-lhe, sorrindo, a moella, 
E uma roda chouriço. 

N'esta jovial cantata, 
Era tremenda a berrata, 
E grande era o borburinho! 
Todos de puc'ra na mão, 
A gritarem: "Venha vinho!"

A creada rindo então, 
Fazia ao padre gaifonas, 
A comer as azeitonas,
E a carne assada com pão. 

Gambôa fez um discurso,
Monumental, e d'escacha, 
O padre com a borracha, 
Não qu'ria passar por urso... 
Já com a penca encarnada,
Era golada... e golada... 
Dizendo: "Isto vai assim!"
E com a vista turvada, 
Berrava já em latim, 
Que nem na missa cantada! 

Nas hortas. À sombra de arvores, J. Novaes Jr., c 1900.
Imagem: Internet Archive

Que belleza!... que belleza!... 
Finda a boa sobremeza, 
Saberão os meus leitores, 
Que todos alli ficaram...
Tal e qual com os... "amores",
E lá riram, e dansaram.

Formou-se uma contradança, 
Bem de pressa, ao pé do tanque, 
Tocava a guitarra o Blanc, 
o cavaquinho o Bragança.

A mana avançando o passo,
De alegria dá um grito,
E ao seu feio... tão bonito,
Trava depressa, o braço.

Nosso Azevedo expedito, 
Que contentíssimo anda, 
Põe o charuto de banda, 
E dansa com Henriqueta, 
Delambida e de luneta,

O nosso Rodrigues tira, 
P'ra par "madama" Gambôa, 
Que pela dansa suspira, 
Na sociedade em Lisboa.

O quarto par é o Sousa,
Que a dar muita gargalhada,
Não se atirou a má coisa...
Pois se agarrou á creada.

Tudo dansa: tudo pula!
Tudo alli se vê a rir...
Só o Gambôa e o padre
Se deitaram a dormir:
Dizendo a rir a creada,
Para a sua querida ama: 
"Deixal-os, minha senhora, 
Aquella fructa quer cama."

Nas hortas. Debaixo da parreira, J. Novaes Jr., c 1900.
Imagem: Internet Archive

Mas o raio do petiz...
(Os rapazes são uns alhos!)
Accorda o padre Luiz... 
Acerta-lhe com dois bogalhos, 
Mesmo em cheio no nariz!

Jámais é eterno o gosto! 
Gamboa grita: "É sol posto, 
Vamos, vamos, minhas filhas,
Que ainda é longe Cacilhas,
Toca a montar a cavallo."

Padre Luiz, logo fal-o;
Mas como estava zaré.
No mofino do estribo, 
Quem diz que enfiava o pé?!

Foi preciso o burriqueiro, 
Ao vêl-o assim tão borracho, 
Pegar-lhe em pezo, e deital-o, 
Bumba! p'ra cima do macho! 

Nas hortas. À entrada da taberna, J. Novaes Jr., c 1900.
Imagem: Internet Archive

Eis grita o padre a cavallo: 
"Vou alegre... vou... deixal-o!
Luduvicus, pater a pé... 
Libera nos est dominé!
Arre! burros p'Azeitão,
Que os cazacas já lá vão!"


(1) Diário Illustrado, 11 de agosto de 1896

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