segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Um romance da vida real (deambulações de Childe Harold...)

Mr. Glenville e Amelia, tête-à-tête nas ruinas do Castelo de Almada...

Childe Harold, veio a Lisboa, para escrever um poema, ao qual deu o nome "Portugal"; para a informação que prestou sobre o país, cujo nome tem, poderia muito bem ter sido escrito em Grub Street; pois depois de um rápido olhar para a Nova e a Velha Lisboa, instalou-se num antigo convento de Sintra, e, fechado do mundo, começou e terminou seu poema em seis meses.

Historical military picturesque..., George Landmann, Sintra (onvento da Pena).
Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal

Começou por descrever a sepultura de Fielding, o romancista, e terminou com a informação, que a Colina de Almada foi o assunto de algumas linhas escritas por Mickle, tradutor do Lusíadas [...]

Vista de Lisboa tomada de Almada (detalhe).
Imagem: Byron, Childe Harold's Pilgrimage..., London, John Murray, 1869

Amélia, que ele imaginara estar a sofrer de uma recaída na sua indisposição, reclinou-se descuidadamente sobre o ombro do honorável Mr. Glenville, que lhe lia o seu interminável poema, que ela ouvia com aparente prazer. 

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Amelia Osborne (1754–1784) por François-Hubert Drouais.
Marquesa de Carmarthen, Baronesa de Darcy, Baronesa de Conyers, Condessa de Mértola.
Primeira esposa de John "Mad Jack" Byron, pai de Lord Byron.
Imagem: Wikipedia

Um ruído, que Freeman fez ao tropeçar em algumas pedras soltas, fez com que se levantassem e Glenville colocasse o braço dela no seu; dirigiram-se para a praia, entraram num barco, e partiram para Belém [...]

Historical military picturesque..., George Landmann, Torre de Belém.
Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal

Embora Harold lhe perguntasse se tinha saído, Amelia nunca lhe disse que tinha ido à Colina de Almada; e Glenville, que o chamou para lhe dar boas-vindas a casa, queixou-se que lhe não tinha sido possível acompanhá-la nos seus costumados passeios nocturnos. Havia decepção e dissimulação nisso, o que Harold não gostou; não havia necessidade de manter em segredo que ela tinha saído com Glenville, e assim, fez Harold suspeitar que nem tudo estava certo [...]

Harold não veio para jantar, nem para dormir: Amelia esperou ansiosamente até à meia-noite, quando um criado lhe trouxe uma carta, como a seguinte:

"Braganza Hotel [rua Do Thezouro Velho, 36], Lisboa

Senhora,

A sua decisão de embarcar para Inglaterra tem toda a minha aprovação, e onde quer que vá, leve consigo os meus melhores votos de saúde e felicidade. Admito que o seu desejo súbito de deixar Lisboa me surpreendeu e teria feito muito mais, se eu não estivesse preparado para uma mudança nos seus sentimentos, ao tê-la visto com o seu amigo entre as ruínas do Castelo de Almada, num momento em que me tinha escrito a dizer que estava muito doente. 

Embarcações no Cais da Misericórdia. Aspecto do Hotel Bragança, ao fundo, na metade esquerda da imagem.
Imagem: Arquivo Municipal de Lisboa

Durante toda a vida tenho tido por costume dar as minhas opiniões livres de disfarces, e se eu a tivesse deixado de a amar, ter-lho-ia dito sem hesitação. Onde não há confiança mútua, não pode haver real afeição, e quando a senhora se inclinou à dissimulação, perdeu tudo, excepto a minha amizade [...]" (1)


(1) John Harman Bedford, Wanderings of Childe Harolde: A Romance of Real Life..., London, Jones & Co., 1825

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