quarta-feira, 14 de maio de 2014

António Avelino Amaro da Silva

De António Adelino [sic] Amaro da Silva pouco se conhece nos dias de hoje.

Pouca memória têm os homens!... (1)

António Avelino Amaro da Silva teria nascido em meados da década de 1820, possivelmente em Lisboa.

Era filho de António Silva, natural de Adão Lobo, Cadaval, nascido a 31 de julho de 1801 e de D. Joanna Francisca da Costa e Silva, filha de Manuel da Costa Telles Almas, de Lamego, que teriam casado em 1821, ou pouco antes.

António Silva, seu pai, conhecido por "Silva das barbas brancas", era o veterano que transportava a bandeira nos cortejos comemorativos do 24 de julho de 1834, evocando a entrada do Duque da Terceira e das forças liberais na cidade de Lisboa.

Bandeira nacional de Portugal de 1830 a 1910, usada pelos Liberais
Imagem: Wikipédia

Este  veterano possuía a medalha das Campanhas da Liberdade (instituída em 1861) com o algarismo 5, correspondente aos anos de serviço durante a Guerra Civil de 1826 a 1834, e a Torre e Espada que lhe fora concedida pela Junta Governativa do Porto, em 1846.

Medalha das Campanhas da Liberdade
Imagem: Wikipédia

Teria tido catorze filhos, dos quais se conhecem, para além de António Avelino Amaro da Silva, Francisco Emygdio da Silva, primeiro taquígrafo da camara dos deputados, e Christiano Gerardo da Silva, professor de musica e artista.

António Silva, pai, morreu em 1879, com 79 anos.

António Avelino Amaro da Silva, agrimensor, piloto examinado pela Escola Naval Portuguesa.

Terá permanecido no Império do Brasil, durante o reinado de D. Pedro II, onde terá exercido engenharia civil, na região de Valença no Rio de Janeiro.

Bandeira do Império do Brasil de 1822 a 1870
Imagem: Wikipédia

A partir  de 1852  o seu nome é por diversas vezes referido na imprensa periódica do Rio de Janeiro relativamente a actos pessoais, legais e administrativos ou, mais frequentemente, em listas de passageiros de diversos navios, registos das muitas viagens que fez entre Portugal e Brasil. *

Enseada da Glória, Ponta do Calabouço e Morro do Castelo, litografia de Benoist e Ciceri, 1852
Imagem: Especial Rio Antigo no Facebook

Em 1859 publica no Correio Mercantil o anúncio do seu casamento e estabelece nova residência.

Valença
Antonio Avelino Amaro da Silva. agrimensor, piloto, examinado e approvado, etc.:
Faz publico a quem interessar, aos que o tem honrado com sua confiança e aos seus amigos. que se mudou para a fazenda de seu sogro, o Illm. Sr. tenente Joaquim Rodrigues de Aquino. no logar denominado Montacavallo, divisa das provincias do Rio de Janeiro e Minas, margens do Rio-Preto, para onde lhes podem dirigir quaesquer correspondencias pelo correio de Santa Theresa de Valença.
Por esta mesma occasião agradece summamente as felicitações que lhe tem sido dirigidas pelo seu feliz consorcio com D. Delfina Amelia de Aquino Silva, e o faz sciente aos que no numero daquelles não tenhão recebido participação.


Em 1863 publicou o romance histórico "O Caramujo", que descreve com notável realismo os acontecimentos de 23 de julho de 1833, a batalha da Cova da Piedade, assim como outros factos, eventos e aspetos da vida dessa época no concelho de Almada.

Capa do livro Amaro da Silva, António Avelino, O Caramujo, romance histórico original, Lisboa, Typographia Universal, 1863, 167 págs.

Alguns autores colocam-no como testemunha presencial batalha da Cova da Piedade, o que é no entanto pouco provável, pois teria pouco mais de dez anos à altura dos factos.

António Silva, seu pai, então com 32 anos, poderia ter participado na batalha da Cova da Piedade ou, ter recolhido a acurada informação de outros membros da Associação dos Veteranos da Liberdade.

Em 1877 encontramos Antonio Avelino Amaro da Silva, acompanhado de uma filha, na lista de passageiros do paquete Cotopaxi na viagem Rio de Janeiro — Lisboa.

Poderia ter sido esta a viagem do regresso definitivo a Portugal.

Anúncio da Pacific Steam Navigation Company, Diário Illustrado, 28 de março de 1877
Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal

A notícia do óbito de António Avelino Amaro da Silva refere a posse da Torre e Espada concedida pela Junta Governativa do Porto em 1846 que, provavelmente, teria sido aquela concedida a seu pai.

Faleceu na sua casa, em Carnide, no ano de 1889.

Antonio Avelino Amaro da Silva, antigo capitão de navios e engenheiro civil.

Esteve no Brasil e ve-io de lá com alguns meios ganhos em serviço de engenharia, sobretudo em medição de terrenos no interior da província do Rio de Janeiro, onde se relacionira com alguns brasileiros de representação, como o fallecido Joaquim Saldanha Marinho.

Também já é fallecido [à data da publicação do livro de Pedro Wenceslau de Brito, 1908].

Aqui viveu modestamente e de vez em quando escrevia alguma cousa para umas memorias intimas, que não chegou a publicar.

Deu ao prelo um romance histórico baseado em factos das campanhas da liberdade.

Descreve com acerto e em boa linguagem o que passou, no concelho de Almada, quando as limitadas forças liberaes trouxeram á ponta de baioneta a tropa do commando de Telles Jordão até Cacilhas, onde foi morto esse famigerado official miguelista, ao qual não faltava bravura e crueza.

Este trabalho foi muito bem recebido e elogiado. (2)

Não sei si nasceu no Brazil ou si naturalizára-se brazileiro, tendo seu berço em Portugal. 

Sendo piloto examinado pela escola naval portugueza, serviu alguns annos como agrimensor na cidade de Valença, provincia do Rio de Janeiro. 

Escreveu: — O Caramujo: romance historico original. Rio de Janeiro, 1863 [...] (3)

Fallecimentos
Falleceu na sua casa de Carnide, onde residia, o Sr. Antonio Avelino Amaro da Silva, que durante muitos annos esteve no Imperio do Brazil onde desempenhou em varias provincias diversas comissões de engenharia cívil.
O fallecido havia começado sua carreira na marinha mercante, tendo servido mais tarde à junta [governativa] do Porto, em 1846.
Deixou um romance histórico intitulado "O Caramujo", onde são descriptas diversas scenas da lucta liberal. (4)



(1) Correia, Romeu, Homens e Mulheres vinculados às terras de Almada, (nas Artes, nas Letras e nas Ciências), Almada, Câmara Municipal de Almada, 1978, 316 págs.

(2) Aranha, Pedro Wenceslau de Brito, Factos e homens do meu tempo, memórias de um jornalista, Lisboa, A.M. Pereira, 1908, 1042 págs.

(3) Sacramento Black, Augusto Victorino Alves, Diccionario Bibliográfico Brasileiro, Vol. I, pág. 116, Rio de Janeiro, Typographia Nacional, 1883

(4) Tribuna Liberal, Domingo, 24 de Março de 1889

Hemeroteca Digital Brasileira

Leitura adicional: Costa Leite, Joaquim da, O transporte de emigrantes: da vela ao vapor na rota do Brasil, de 1851 a 1914




O SILVA DAS BARBAS BRANCAS  (*)

[Excertos do artigo que retrata António Silva, pai de António Avelino Amaro da Silva, escrito em 1879. As notas em itálico são da edição de 1908.]


.
António da Silva, o veterano da bandeira
Imagem: Archive.org

I

Ouvindo o troar da artilheria, que annuncia á família liberal uma grande festa ;

e vendo o desfilar do cortejo cívico, que nos aviva um notável facto da historia contemporânea, inscripto com letras de oiro nos fastos nacionaes, notamos uma falta: entre aquelles beneméritos, cujos cabellos encaneceram no serviço da pátria e da liberdade ;

Este capitulo, ou trecho, foi escripto para o Diário Illustrado, de julho 1879, e agora sáe com algumas notas que para ahi não pude mandar.

É, emfim, o Silva das Barbas brancas, como o cognominava o povo, quando elle em dias dúplices lançava para fora do fino peitilho da camisa aquellas alvíssimas barbas, que lhe davam o aspecto dos homens bons e de bom conselho de tempos áureos;

é o Veterano da Bandeira, como depois o appellidaram quando foram inaugurados os festejos do 24 de julho.

Esta commemoraçao deixou de fazer-se por circumstancias politicas, que não vem para aqui referirem-se ; mas a principal, no meu entender, foi a do esmorecimento na lembrança de factos, que não deviam esquecer para lição dos vindouros;

II

O venerando ancião nasceu aos 31 de julho de 1801 no logar de Adão Lobo, termo da villa do Cadaval ;

e veio para Lisboa fugido com a sua familia, e a pé, não tendo ainda 7 annos de edade, quando Junot invadiu Portugal com as forças do seu commando.

Embarque da família real para o Brasil no cais de Belém, gravura, Henry L'Évêque
Imagem: Wikipédia

Chegando a Lisboa, a familia Silva teve que separar-se do seu pequeno António e entrega-lo ao cuidado das pessoas, que o protegeram na mocidade.

Discorreram, portanto, os primeiros annos da sua estada na capital sem incidente notável, embora conhecessem os amigos que António da Silva roubava algumas horas ao trabalho e ao descanso para se relacionar com os homens de esphera mais elevada e tomar conhecimento das occorrencias politicas, enthusiasmando-se com o alvorecer das idéas liberaes que trouxeram, na proeminência dos factos contemporâneos, Fernandes Thomás, Ferreira Borges, fr. Francisco de S. Luiz e outros beneméritos, e pelos esforços destes inclítos varões, o 24 de agosto de 1820.

Porém, no meio dos seus enthusiasmos, António da Silva pagava o tributo da mocidade prendendo-se nuns sinceros amores a uma joven de apreciáveis dotes do coração, D. Joanna Francisca da Costa e Silva, filha de um bom homem de Lamego, Manuel da Costa Telles Almas.

Em 1821 encontramo-lo já casado, mas interrompida a lua de mel por uma eventualidade da politica, que o tirava dos braços affectuosissimos da esposa para o arremessar ás rudas fainas da caserna.

Tinham-no intimado para assentar praça, e elle foi alistar-se no regimento de milícias de Lisboa Occidental, mais conhecidas por milicias de D. Jorge, ficando primeiramente na 3.a companhia desse corpo, e depois na de granadeiros.

A agitação revolucionaria da época ; a convivência com alguns homens que acreditavam religiosamente que o 24 de agosto vingaria contra as dificuldades oppostas pelo partido contrario ;

III

É geralmente sabido, que os dois primeiros quartéis do século XIX foram povoados de successos que davam muitos volumes e que pela maior parte estão inéditos.

Ainda mais: muitos acontecimentos passaram sem registo particular, nem publico, e seria hoje extremamente difficil reunir todas as notas para dar inteiro relevo ás paginas da historia contemporânea numa serie, pelo assim dizer, ininterrupta de incidentes, de acção e reacção, de estímulos, ódios, perseguições, vinganças, que a liberdade protegia em seu interesse, mas offuscando o seu brilho ;

Kssssse! Pédro - Ksssse! Ksssse! Miguel! Gravura, Honoré Daumier, 1833
Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal

e que ao mesmo tempo a liberdade repellia para tornar mais vivida a sua luz ; uma época de combates, de lutas terríveis e homéricas, que parecia ser impossível emprehenderem-se se milhares de testemunhos não o confirmassem: porque a 1820 succedia 1824; a esta data seguia-se 1828; depois vinha 1829 e 1834; depois 1836, 1837, 1838, 1840, 1844, 1846.


V

Os veteranos, seus companheiros, deviam-lhe serviços de valia sendo os mais importantes a fundação da associação dos veteranos da liberdade, de que elle foi thesoureiro ;

e as instancias, junto de velhos amigos seus nas duas casas do parlamento, para que o estado tirasse da miséria a que estavam condemnados alguns desses beneméritos, que derramaram o seu sangue em defensa dos princípios liberaes.

António da Silva, o Veterano da Bandeira, falleceu com 78 annos de edade em junho de 1879, tendo ao lado seus três filhos, que lhe restavam de quatorze, e que o honravam, os srs. Francisco Emygdio da Silva, primeiro tachygrapho da camara dos deputados;

Já falleceu. Era um santo homem.
Estimavam-no todos no quadro tachygraphico e respeitavam-no porque sabia muito bem da sua profissão.
O que muitos ignoravam era que elle, filho devotado e obediente, educado sem alardos e com a sobriedade de um portuguez de lei, depois de emancipado e depois de exercer sem faltas e com brilhantismo a sua profissão, em que adquirira um primeiro logar, quando recebia o ordenado ia religiosamente entrega'-lo aos pães para que o applicassem como entendessem nas despezas geraes da casa, reservando-lhe apenas o de que elle necessitasse para gastar com a renovação do seu vestuário.
Prescindia de commodos e de modas. Exemplar filho !

Antonio Avelino Amaro da Silva, antigo capitão de navios e engenheiro civil ;

Esteve no Brasil e ve-io de lá com alguns meios ganhos em serviço de engenharia, sobretudo em medição de terrenos no interior da província do Rio de Janeiro, onde se relacionira com alguns brasileiros de representação, como o fallecido Joaquim Saldanha Marinho.
Também já é fallecido [à data da publicação do livro, em 1908. Falecera em 1889].
Aqui viveu modestamente e de vez em quando escrevia alguma cousa para umas memorias intimas, que não chegou a publicar.
Deu ao prelo um romance histórico baseado em factos das campanhas da liberdade.
Descreve com acerto e em boa linguagem o que passou, no concelho de Almada, quando as limitadas forças liberaes trouxeram á ponta de baioneta a tropa do commando de Telles Jordão até Cacilhas, onde foi morto esse famigerado oíRcial miguelista, ao qual não faltava bravura e crueza.
Este trabalho foi muito bem recebido e elogiado.

e Christiano Gerardo da Silva, professor de musica e distincto artista.

Foi um violinista distincto e por vezes regeu orchestras em salões particulares e theatros.
Está retirado da vida artistica.
E' proprietário em Lisboa.
Vive, edoso e doente.

Tinha a medalha com o algarismo 5 das campanhas da liberdade e a junta do Porto, por um acto de bravura, concedera-lhe a Torre e Espada, em 1846.

Tropas aplicam vergastadas a um popular durante a Patuleia
Imagem: Wikipédia

Comecei a conhecer e estimar este bom ancião por 1849 ou 1850.

Preparava-se a regeneração.

Elle auxiliava, como podia, os que conspiravam em Lisboa desde os desastres da Maria da Fonte, e exclamava :

— Se os Cabraes matam a liberdade, expulsemos os Cabraes !


23 de julho, 1879.

O António da Silva, pela sua dedicação á causa liberal, pelo respeito á memoria do imperador e rei D. Pedro IV e do seu dilecto general Sá da Bandeira, que tantos serviços prestou com grandíssimo sacrifício do seu sangue e dos seus haveres para a consolidação do throno da rainha D. Maria II, nao se esquecera nunca dos seus companheiros, que se oppuzeram com brio e tenacidade aos desvarios e oppressões ignominiosas da usurpação miguelina, e auxiliava, dentro das suas pequenas forças monetárias, para lhes minorar a miséria.

Foi um dos que mais poderosamente contribuíram para a creação da Associação dos Veteranos da Liberdade.

Refere Simão José da Luz, na sua interessantíssima biographía do ínclito Marquez de Sá da Bandeira, quando descrere no tomo n as exéquias solemnes celebradas na parochiai egreja da Encarnação, em suffragio da alma desse que foi valente e sábio militar, que á porta da mesma egreja esuva um respeitável veterano a pedir que o auxiliassem na obra de caridade a favor dos companheiros daquelle general que, por doença ou indigência, nào podiam comparecer naquelle piedoso acto.

O Marquez fallecera em Lisboa no dia 7 de janeiro 1876 e o cadáver foi transportado para o cemitério de Santarém, com as honras devidas, onde ficou em campa, com o epitaphio determinado em nota testamentária do illustre finado.

As exéquias solemnes realisaram-se no dia 21 de fevereiro do citado anno, proferindo a oração fúnebre o afamado orador sagrado, rev. cónego da Sé de Braga, Alves Matheus.

Na pag. 509, do mencionado tomo II, lê-se esta singela nota :

"Á porta do templo pedia esmola para os pobres soldados da liberdade o fundador da Associação dos Veteranos, o sr. António da Silva, que ainda assim pôde realizar a quantia de 15$500 réis" .

 (*) Aranha, Pedro Wenceslau de Brito, Factos e homens do meu tempo, memórias de um jornalista, Lisboa, A.M. Pereira, 1908, 1042 págs.

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